quinta-feira, 12 de novembro de 2015

5:41 PM


                   Te vi num pensamento perdido numa rua qualquer, sem motivo aparente mas o suficiente para tua pessoa me sufocar inconscientemente. E mesmo quando já havia partido, eu ainda tentava redobrar o fôlego que seu rosto me tirou, mesmo nele não havendo nada de especial. Nunca houve, nunca esperei que houvesse e talvez nunca haverá, mas isso não me incomoda e parece não te incomodar, pois você continua aparecendo em cada esquina, em cada sombra, em cada esperança e não sei o que espero que você faça depois disso. Não há celebrações a serem feitas, ou até mesmo abraços a serem dados; há somente duas pessoas que convivem em momentos diferentes, diferentes ideias, diferentes ideais. Dois ladrilhos diferentes que as vezes se esbarram e fazem mosaicos no chão de pedra.
                 Lembro do travesseiro de água, que ficava tão bem com meus cachos e do cigarro que sempre encaixou facilmente entre seus dedos. Botas que não foram feitas para correr e bancos que não foram feitos para serem andados sobre. Não havia chuva e certamente não havia esse calor que meu corpo não consegue se livrar. O único calor que existia era o irradiado pelo seu corpo que passava para o meu num aconchego, e suas mãos eram tão frias quanto a brisa que me fazia dançar em giros. Um beijo que ambos estávamos bêbados demais para lembrar com detalhes, você de álcool e eu de paixonite, mas soubemos em um encontro de olhares que ele aconteceu. Não me lembro do amanhecer, mas para mim não havia nem a noite. Havia estrelas rodopiando, rosa cobrindo o céu, vermelho nas bordas dos seus lábios e resto de licor queimando os meus, visão que até Van Gogh teria inveja. Não havia silêncio constrangedor ou berros de estranhos, somente sussurros percorriam minha mente, vozes que pareciam suas, mas eu só te via sorrir sem motivos.
                    Não lembro de ter ido dormir, não lembro de ter bebido, mas acordei numa cama e havia ressaca. Não minha, mas tua. Tua cama, tua ressaca, tuas reviravoltas. E sem "bom dia" fui embora e sem "adeus" te vi fugir. Não haviam erros a serem consertados, éramos duas manchas que não podiam ser apagadas: da história, do universo, da mente um do outro. Não importa qual obra de arte tínhamos criado, havia a necessidade em seus olhos de fazê-la sumir. E mesmo com todos os dias que se seguiram e aos diversos encontros que fomos submetidos, sua pessoa não via a minha, mesmo quando você era a única que a minha visse. E, nossa, como ela via: em cada momento de desespero ou euforia, em cada roçar de pernas e em toda vez que eu me animo contanto fatos.
                  E você comentou uma vez, para Deus sabe quem, que meu perfume não saia de seu quarto, que meu batom quase não saiu de seus lençóis e que aquela música ainda o fazia lembrar de mim. Então talvez estejamos fadados a viver com a sombra do outro, você sabe como o universo ama uma piadinha cósmica e como os cósmicos são os únicos que não mentem. E nesse jeito estranho de amar o que não nos pertence, seguimos nos encontrando e criando obras de arte com olhares que tentam não se ver.