terça-feira, 22 de setembro de 2015

7:39 PM


Criamos um lar só nosso, que continha apenas dois cômodos: um vermelho e um confusamente imenso. No vermelho cultivamos flores: as que eu gostava, as que você gostava - mas insistia em não aprender os nomes-, e aquelas que nenhum de nós sabia como foi para lá, mas amávamos-las igualmente. Quando ficava muito pequeno, pulávamos para o cômodo superior, onde havia espaço até demais então aproveitávamos para colar fotos em cada local; fotos que eu repassava, loucamente, quando você não estava por perto, sempre houve uma sensação de conforto quando elas estavam a minha volta.
Porém flores vieram e foram, até que cultivá-las não fosse mais possível, talvez a culpa fosse minha de ter cansado de mantê-las ou fosse sua por ter insistido sempre nas mesmas. Ou talvez tenha sido a imensidão sempre com as mesmas fotos, até que estas ficassem desgastadas e sem cor, e observá-las cessasse de ser meu hobby. 
Você não concordou, disse que não entendia o por que desse meu desânimo repentino e dessa impaciência no meu rosto. Talvez sua cegueira estivesse plena e não houvesse como você notar como as flores morriam trazendo um cheiro mórbido por tudo aquilo que era meu viver. Não se vive na morbidez, não há como reviver o que já havia sido enterrado. Mas você olhou para mim e em sua voz trêmula comentou como você não continha lar a não ser meu coração e como viveria sem razão se não tivesse minha mão contra a sua e sua respiração acompanhando a minha. 
Desde então reformei minha casa, as paredes continuam vermelhas e aqui e ali cai de aparecer uma flor desconhecida, mas agora crio pássaros e posso lhe dizer que eles são imensamente lindos. O cômodo de cima continua cercado de fotos, não nossas mas de outros - mas confesso que coloco alguma selfie de vez em quando. Ainda não me acostumei em ter tudo para mim, por isso de vez em quando convido alguém, mas eles não ficam pois essa não é casa deles, é minha e era nossa.

domingo, 13 de setembro de 2015

15:34 PM

Chovia de noite. Apenas uma pequena garoa, mas foi o suficiente para ela conseguir pegar ar novamente - toda àquela loucura não era para ela. Deitada num muro coberto de folhas, ela observava o céu escuro com manchas cinzas, que mais pareciam fumaças de charutos do que nuvens, e tudo aquilo era bom demais para ser verdade. Claro, o coração dela estava a mil em seu peito, mas sua mente parecia estar em outro lugar. Sentia-se conectada com as folhas em que encostava e a garoa limpava todas as suas preocupações.
Ela passou a mão pela blusa que não era sua, estava totalmente molhada, e a garota não podia dizer se era de suor ou chuva; e ela gostou disso. Ela gostou da sensação de estar perdida no mundo mas não em si, ela sabia o que fazia e porquê fazia. Sua mente percorreu milhares de devaneios até um gato passar por seu lado, era branco com tons de laranja, olhou-a de cabo a rabo e subiu em seu corpo, onde aninhou-se e deitou. Sentia-se em êxtase, mesmo não querendo se mover ou fugir dali. Acariciou o gato, que ronronou em retorno. E com os olhos quase cedendo à vida, ela virou para observar aquele menino que a levou para lá, que era a razão de tudo, provavelmente. Ele observava o céu também, mas não tranquilamente e sim com indignação. Ela só via o perfil dele, as sardas que cresciam e depois sumiam; os cílios, que curvavam-se e prendiam pequenas gotas, eram longos e infinitos; a testa franzida trazia para a pintura um ar grosso e rústico, algo que talvez nem Michelangelo conseguisse criar. A respiração que ia contra a dela, logo foi se acalmando e junto foi se desfazendo o peso no olhar, não demorou muito para que ela notasse que ele tinha adormecido. seus lábios estavam entreabertos e ela sentia que tudo o que ela desejava estava, de alguma forma, escondido nesse menino. Observando-o mais uma vez, e deixando que seu subconsciente tomasse conta, ela sussurrou o nome dele como se fosse o segredo mais lindo que ela um dia pode guardar.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

9:20 PM


Tudo vai sumindo.
Até que só reste nós dois,
num ambiente tão aberto
que não há como isolá-lo.
E você note que existe nós,
mesmo quando tudo grite para que não haja.
E no meu olhar há mais que histórias,
no seu só há aquela profunda derrota.

Podemos só ignorar?
Todo aquele espaço
que não deveria existir no vácuo.
Oh Deus, perdoe-me de toda essa dor que me causo,
toda a teimosia que vive em meu peito,
mas por favor,
faça-o olhar para mim só uma vez.
Que ele seja a última coisa que minha memória se lembre,
e, oh, se em seus braços eu desse meu último suspiro.

Já não sei mais sobre o que escrevo.
Melhor ir para longe,
para onde minha mente não lembre mais de ti -
se ninguém se lembra, será que realmente aconteceu?
Em devaneios paridos, me parto:
para outras mentes
e pessoas mais contentes.
Nessa já não há mais salvação.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

9:08 AM


  Seus gritos eram sucumbidos pelo diabo que a açoitava.
  Sua pele rasgava-se por dentro e por fora, e mesmo não estando completamente nua, era assim que se sentia. O cérebro pulsava na busca de uma fuga, mas tudo que seus olhos viam era o mundo coberto de sangue. Parte dela desejou que a morte fosse apenas um breu infinito, para que ela não tivesse que estar aqui agora. Cada parte de si queimava: seu rosto, suas pernas, até as pontinhas dos dedos. Cada célula berrava sem saber o que fazer. Sua identidade parecia estar escorrendo para fora e ela fazia questão de queimar cada canto exterior de si no processo.
  Até que sumiu.
  O diabo largou-a.
   Levantou, vestiu sua roupa íntima e abotoou a calça. Não disse nenhum adeus, mas também não havia dito nenhuma saudação, Só largou-a lá, sozinha num poço de desespero.
   Ela não sentiu nada, seu corpo inteiro desligou-se como se fosse reiniciar e algo havia dado errado. O mundo sangrento logo se desfez e em seu lugar ficou um céu negro sem estrelas. um mundo de ausência.
   E ficou. Até o orvalho molhar e limpar seu corpo. Até alguém passar e lhe dirigir a palavra. Até levantarem-na e a levarem dali. Até sentar numa cadeira fria e não responder nenhuma pergunta. Até abraçarem-na e fazerem promessas. Só ficou lá, esperando ser reiniciada. esperando que alguém notasse que ela não estava mais lá. Que ela havia deixado de existir. Que nela só havia ausência. 

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

11:38 PM


  Meu primeiro coração partido ocorreu várias vezes, cada uma em uma intensidades, até torna-se impossível de suportar. Foi na mesma medida que o amor, crescendo de forma incontrolável até que meu hobby tornou-se amar as pessoas em minha volta; bem, pelo menos era assim até eu ter meu coração realmente partido.
  A dor veio, não exatamente onde estava o coração, mas no centro do peito. Era como se algo estivesse lá, interferindo, me impedindo de respirar, impendido o sangue de passar. talvez o ar tenha se tornado muito denso e meu sangue grosso e pastoso, a ponto de meu corpo não conseguir mandá-lo para frente; duvidava até que a cor de meu sangue fosse vermelha, no meu peito ela soava mais como negra ou acinzentada - um bloco de cimento. 
  Logo o ar parou de passar e eu senti que iria ter um ataque de pânico. Que loucura a minha! Um ataque de pânico por um coração partido? na verdade que coração? duvidava até mesmo que ele estivesse lá, talvez nem bombeasse mais sangue - não o sentia bater contra meu peito. Talvez fosse isso que pesasse e não minha consciência. Afinal, eu não me arrependia de amá-lo ou de tê-lo escutado; eu sentia mesmo era raiva, uma raiva tão grossa e densa que subia de meu peito, formigava meu nariz e escorria pelos meus olhos. Toda vez que olhava ao redor estava chorando, ou uma tentativa falha de não chorar. Não queria chorar porque não sentia tristeza, sentia-me traída, sentia-me usada, sentia-me um poço de emoções que não constava felicidade ou decepção. 
  Não sei o que esperar agora, como que se vive depois de um fora com uma declaração de amor? Porque você não acabou com nós porque não me amava, mas porque não tinha forças para me amar. Não sou a culpada dessa história e nem é a aquela com quem você anda. Talvez seja apenas aquela falha da sua personalidade, que o faz desistir do amor e de ser amado. Mas sinto em lhe dizer que aqui não é nenhum livro para eu correr para seus braços, se você não vier para mim não irei para ti. Simples assim. Nem todo o amor do mundo pode consertar a falha do seu sistema. Assim como nem todo o amor do mundo pode consertar a falha que você inseriu no meu. 

terça-feira, 1 de setembro de 2015

11:50 PM



É engraçado dizermos ‘tchau’ para algo que nunca foi nosso e desejarmos que ele volte.
É engraçado como nosso ego é tão grande a ponto de pensarmos que algo nesse universo - grande, cheio de milagres e formas infinitamente coloridas, cada qual com sonhos que se transformam em planos incompletos e peculiares - possa pertencer à nós, pessoas egoístas que se recusam a pertencer a algo simples como uma muda de roupa.
É engraçado quando soltamos nossas mãos, aquela certeza que aquilo que fora solto seja tão necessitado que tenha de prender sua mão novamente à nossa, como uma criança desesperada pelo toque reconfortante de sua mãe.
É engraçado que nós, ambos espíritos livres procurando por algo que nos acompanhe, tenhamos acreditado por um segundo sequer que um não conseguiria viver sem o outro, ou melhor, que um seria tão facilmente atrasado só para satisfazer o ego alheio. Assim como estrelas, nós não dependemos de ninguém além de nós mesmos para queimarmos até a morte e nada vai nos atrasar em nossa destruição interna.